Se vos disser quem foi João Leitão da Silva, talvez não saibam de quem estou a falar. Mas se, a seguir a este nome, eu atirar um "Almeida Garret", de pronto todos o identificarão, embora a maioria continue na mais completa ignorância sobre o real valor do Homem. Pois eu, que ignoro quase por completo esse valor, lá vou pelo menos sabendo alguma coisinha que me eleva do zero absoluto. Mas pouco, muito pouco...
Começo com aquela que é, ao que dele li até hoje, o mais brilhante pensamento que o senhor Leitão(1) produziu. Ei-lo: «E eu pergunto aos economistas políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar à miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infâmia, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico?»
O parágrafo é maior, e aponta farpas à Inglaterra, em alturas em que a Revolução Industrial começava a ser ligeiramente contestada em relação ao número de horas de trabalho, suas condições, remunerações. Por isso, para o lerem na integra (vale a pena, acreditem), leiam o Viagens na Minha Terra, ao seu capítulo III. Ainda em relação à Inglaterra, e para vermos como o P.I.B. per capita pouco se relaciona com uma nação que provêm a todos os seus cidadãos, dou por vezes por mim a pensar no anacronismo de uma nação que, sendo a mais poderosa do mundo na segunda metade do século XIX, a espezinhar por exemplo a nossa (também ela colonial e espezinhadora) e muitas outras sem a sorte da portuguesa (a independência); conseguia ter uma capital cheia de assalariados que viviam quase na miséria e muitos outros que trabalhavam ao dia ou simplesmente não o conseguiam fazer, vivendo nos famosos slums londrinos, na mais abjeta pobreza; sendo ao mesmo tempo a capital de um império onde o sol nunca se punha (2).
Voltando a Almeida Garret: é sabido que a sua puerícia foi passada entre a cidade do Porto, onde nasceu; pois veio ao mundo na rua do Calvário (crismada de rua do Dr. Barbosa de Castro desde Setembro de 1921) e Vila Nova de Gaia a partir de 1804, primeiro no Candal, depois no Sardão (Oliveira do Douro).
Em 1864 a Câmara Municipal do Porto decidiu colocar uma lápide comemorativa, na fachada do edifício onde havia nascido o seu notável filho. Mas os trabalhos arrastaram-se e a pedra foi apenas colocada – suprimindo uma janela central – em janeiro de 1866. Conforme um jornal da época – O Nacional – refere, a lápide foi produzida na «oficina do Sr. Costa», sendo de mármore, oval, contendo os seguintes símbolos: uma lira, uma coroa e no centro uma grinalda de louros. E nela a seguinte inscrição: Casa onde nasceu aos 4 de fevereiro de 1799 João Batista da Silva Leitão de Almeida Garret. Mandou gravar à memória do grande poeta a Câmara Municipal desta cidade em 1864.
Passados já tantos anos, a verdade é que ainda hoje podemos admirar no local a referida lápide. E eu diria, que sorte temos! Isto porque, em abril de 2019, um misterioso incêndio destruiu por completo a casa. Tudo o que dela restou foram traves calcinadas que outrora suportavam o chão dos seus pisos. Esta casa, quando reconstruída, já não será obviamente a casa onde nasceu o insigne portuense, com a exceção da sua fachada; embora acredite assim a continuarão a tratar.
Há dias ficamos a saber que a Câmara Municipal do Porto está a tentar adquirir o piso térreo daquele prédio, para ali instalar um polo do Museu do Liberalismo. Faço votos para que tenha sucesso na persecução desse objetivo; pois aquele espaço será sempre um local simbólico da cidade.
Viriato
ӽӽӽ
1. Almeida Garret é apelido que ele trasmalhadamente adotou, quando já não residia no Porto, de um outro ramo da sua família; transtornado que estava de o terem tratado na escola por bacorinho.
2. Pese embora, e em favor deste país, quando em 1837 a rainha Vitória subiu ao poder já cerca de 50% da população sabia escrever e ler, e quando a mesma faleceu, em 1901, essa percentagem aproximava-se dos 100%. Um feito! (esta foi a minha fonte, que vale a pena ver até ao fim)
Sem comentários:
Enviar um comentário